terça-feira, 5 de maio de 2009

O início

Esta nossa história não tem claramente nenhum inicio definido no tempo. Acho que a primeira imagem que guardo de ti é a de um puto demasiado alto, com uma boca um tanto ao quanto grande e um aparelho que te reluzia o sorriso já então bonito. Depois foste o colega das aulas de música (às quais ia essencialmente porque era secretamente apaixonada pelo professor).

Mais tarde foste companheiro de viagens, aquelas que marcam por serem as primeiras. Sei exactamente o momento em que te tornaste especial para mim. Foi ao telefone de um quarto em Budapeste, quando do outro lado me dedicaste os Silence Four a cantar “I’m so in love with you, I’ll be forever blue….”. Como diria um personagem do livro que acabo de ler: “em mim nada se desgasta “. As imagens que tenho da minha vida conservam os contornos e as cores originais… por isso nem sei se lhes posso chamar recordações já que se encontram no mesmo plano que o presente. E por isso consigo ver-me, de joelhos no chão, num quarto às escuras apenas iluminado pelas luz dos candeeiros da rua que furava pelas frechas das persianas. No meio das camas das minhas mais duas companheiras de quarto, agarrada com as duas mãos ao telefone, em silêncio, e com o coração absolutamente disparado. Quase fora de mim. Mas não, ainda não era paixão. Era apenas um sentimento que eu não sabia identificar e que claramente desvalorizei. Preferi a melancolia que tanto me caracterizava.

Adorava gostar de pessoas que não me correspondiam com o mesmo sentimento, acho que gostava da forma como a dor me dilacerava, e me fazia encontrar encanto em pequenos gestos, paisagens, músicas e situações. Gostava, e ainda gosto dos momentos pintados em tons de tragédia grega, em que eu, pobre vítima e escrava das escolhas do meu coração, sofria desalmadamente.

Nesse ano a nossa amizade consolidou-se. Escrevíamos longas cartas um ao outro, descrevendo-nos mutuamente. Tenho ainda guardada na memória a carta em que me explicas porque tanto gostavas de mim: da minha personalidade que dizias preencher-te. Nessa altura estavas presente em todos os momentos, para me apoiares, para crescermos juntos, discutindo política, ouvindo Incubus... Contigo discutia o que era o amor, o que achávamos que deveria ser amar. O que eram os sonhos, o que era o futuro. "Sofres demasiado, não sofres?" perguntaste-me uma vez. Entendias-me. Projectávamos-nos no tempo. Construíamos-nos. Viajo agora até esse tempo por força dos meus “cadernos”. Vejo a nossa amizade vestir-se de uma paixão quase louca que rebentava num beijo inesperado numa noite em Itália. Vejo trovões, gôndolas, lágrimas, noites em claro e promessas.

Ainda te lembras daquela viagem à Régua?

Da mesma forma inconsciente que a paixão floresceu também se descristalizou num abandono do qual só recordo a dor, pois claro. Dilacerante. Mas a amizade que eu julgava perdida nasceu nem sei de que cinzas, com mais força ainda. Renasceu das coincidências, das cumplicidades, das convicções, mas também dos segredos que ainda tínhamos um para o outro.

E novamente houve paixão. Louca, desajeitada e acima de tudo, descoordenada.

Sofremos, crescemos e lutamos por não nos perdermos.

Finalmente conquistaste-me e eu conquistei-te.

Gosto de ti de uma forma inexplicavelmente natural.

Este blogue servirá para nos lembrarmos, mesmo à distância, que o nosso sentimento é já enorme… não há necessidade de o empolarmos (quão nossa é esta palavra?)

Este blogue serve para que, quando a emoção nos toldar a alma e nos virmos como perfeitos um para o outro, nos lembrarmos dos laços fraternos que nos unem, e voltarmos à realidade com um…

MENOS, TÁ?